Os olhos vidrados de Jennifer na TV pareciam querer se
fechar. O monstro tinha acabado de atacar a mocinha no filme, e o medo da
garota continuava, mesmo estando assistindo a uma película em preto e branco.
Com as luzes da sala desligadas e a decoração de halloween
da casa inteira, a tensão era ainda maior, mas Jennifer estava longe de
desistir de assistir seu filme.
Havia uma panela enorme cheia de pipoca em seu colo, que ela
derrubou assim que ouviu o telefone tocar. O aparelho estava na mesinha ao lado
do sofá e piscava freneticamente sua luz vermelha interna enquanto seu toque
fazia um escândalo pela casa silenciosa.
- Alô? – Disse Jennifer, ao atender.
- Oi... – Respondeu uma voz masculina.
- Quem fala?
Jennifer esperou a resposta com o telefone na orelha, mas
nada se ouviu além da respiração ofegante do homem que estava do outro lado da
linha.
- Você quer falar com o senhor ou a senhora Tristan? –
Insistiu a garota – Eles acabaram de sair, sou a babá, você pode deixar um
recado se quiser...
- Você está sozinha?
- Vou desligar – Jennifer colocou o telefone de volta no
gancho e suspirou, aquele era o terceiro trote da noite, tudo por causa do
halloween.
Ela começou a se perguntar se tinha sido uma boa idéia ter
aceitado ficar de babá naquela noite ao invés de ficar vendo filmes de terror a
noite toda com o amor de sua vida, Thayer. E como se não bastasse todos os
trotes que estavam passando para os moradores daquele bairro afastado da
cidade, ela ainda tinha que agüentar sua melhor amiga Amy mandando torpedos de
cinco em cinco minutos lhe dizendo como ela estava se divertindo com seu
namorado Billy, como se uma festa dos anos 80 fosse considerada divertida.
Ela olhou pra mesa e viu um jornal encima dela, a manchete
dizia “Mais uma babá encontrada morta”, mas não ligou pra isso. Pegou a folha e
juntou com ela as pipocas que haviam caído no chão. As colocou de volta na
panela e amassou o jornal até virar uma bola de papel.
Quando a campainha tocou, Jennifer olhou para trás, mesmo
não podendo ver a porta. Ela se levantou, esperando que fossem crianças pedindo
balas ao invés de mais uma brincadeira sem graça de crianças tocando a
campainha e correndo. Dobrou o corredor e abriu a enorme porta branca. Duas
crianças estavam a sua frente, logo atrás uma mulher que as estava guiando.
- Gostosuras ou Travessuras? – As duas disseram ao mesmo
tempo.
Um sorriso alegre brotou no rosto de Jennifer quando ela
percebeu que fantasias as garotas estavam usando. As duas estavam vestidas de
bailarina, mas cada uma de uma cor, só para destacar mais o fato delas serem
gêmeas.
- Oi bailarinas – Disse Jennifer, sorrindo – Eu tenho alguns
bombons pra vocês aqui... – Ela pegou a sacola pendurada atrás da porta e
colocou uma mão cheia de balas dentro da sacola de cada uma das garotas – Aqui
está, mas não comam antes do jantar.
- Pode deixar – Disseram as garotas, ao mesmo tempo. Elas
saíram correndo.
- Obrigada – Agradeceu a mulher.
- De nada – Jennifer deu um ultimo sorriso e observou a
mulher indo na direção das garotas.
Ela podia ouvir que elas estavam dizendo perfeitamente, pois
pareciam gritos. As garotas estavam disputando pra ver quem tinha pego mais
bombons, e parece que a disputa estava acirrada.
Quando as três desapareceram da visão de Jennifer, ela moveu
a porta com o intuito de fechá-la, mas parou assim que seus olhos bateram nos
bonecos mutilados que estavam na porta da casa como decoração. Tinha muita
coisa ali, como as abóboras com olhares malignos e enfeites de bruxa espalhados
pela varanda, mas os bonecos chamavam muito mais atenção. Havia um homem jogado
nas escadas que subiam para o pátio de entrada, suas tripas estavam de fora. E
perto da cadeira de balanço marrom, havia uma garota loira enforcada, sua
língua estava pra fora.
- Isso que é ser realista – Murmurou Jennifer para si mesma
antes de fechar a porta.
Ela andou até a sala novamente, bem na hora em que o
telefone tocou de novo. Com um suspiro longo, ela andou até o aparelho e o
colocou na orelha, já esperando por mais um trote.
- Alô?
- Você está sozinha? – Era a mesma voz de antes.
- Você não tem mais o que fazer, idiota? – Jennifer desligou
e colocou o telefone novamente no gancho.
Ela suspirou, ainda olhando para o aparelho, temendo que
outra ligação fosse feita e ela explodisse de tanto estresse, mas o telefone
não tocou outra vez. Ela esperou mais um pouco, só que nada aconteceu. Seja lá
quem tenha ligado das outras vezes, felizmente já tinha se cansado de brincar.
Depois que desistiu de olhar para o telefone, seu visão a
direcionou para o quadro da família que ficava encima da penteadeira onde se
encontrava a TV de plasma. A família Tristan estava toda ali, com trajes finos
e poses impecáveis que acabaram ajudando a pintura a ficar mais macabra ainda.
Nada dava mais medo do que seus olhares que pareciam estar observando Jennifer.
E as crianças eram piores, pareciam fantasmas de pessoas que morreram no século
XVIII.
Ao reparar nas crianças percebeu que era hora de subir e ver
como elas estavam lá encima, ou então os senhores Tristan poderiam descontar
alguma coisa de seu salário. Ela deu meia volta e subiu as escadas normalmente.
Andou pelo corredor de madeira e entrou na segunda porta da direita, era o
quarto do garoto de nove anos, Andy. Apenas a luz do corredor iluminava o
quarto, além do abajur de dinossauros que refletia os animais na parede do
quarto. Jennifer podia vê-lo perfeitamente da porta, estava deitado em sua
cama, de peito pra cima, o cabelo castanho em forma de cuia caia em seus olhos.
Parecia ser um sono bastante profundo, nenhuma criança seria capaz de fingir
tão bem.
Jennifer fechou a porta assim que constatou que ele estava
bem. Ela virou-se e abriu a porta do outro lado do corredor, era o quarto da
garotinha de sete anos, Audrey. O quarto ainda estava com a luz acesa a pedido
da garota, mas o abajur ao lado de sua cama cor de rosa também estava ligado. E
ela estava acordada, mesmo tentando disfarçar quando viu Jennifer abrindo a
porta.
Jennifer andou até sua cama e sentou ao lado dela.
- Audrey, por que você não está dormindo?
Audrey não disse nada, apenas forçou seus olhos a ficarem
fechados, mas Jennifer podia ver isso.
- Audrey – Jennifer a balançou – Eu sei que você está
acordada.
- Ok... – Sussurrou Audrey, dando-se por vencida. Ela abriu
os olhos e olhou pra sua babá desta noite – Você vai contar pros meus pais?
- Não, eu sou sua amiga, lembra? Mas você vai ter que me
dizer porque não está dormindo.
- Eu não consigo. Tenho medo.
- Medo de que?
- É halloween. Andy disse que os monstros saem hoje pra
pegar as crianças que têm medo do escuro.
- Audrey – Jennifer sorriu – Andy está mentindo, ele só quis
assustar você. Não tem monstro nenhum.
- Não tem?
- Não. O halloween é feito para afastá-los, querida. Quando
você estiver maior vai entender, mas agora preciso que você durma. Você acha
que consegue?
- Eu não sei... – Audrey olhou para suas mãos encima de seu
peito, estava com vergonha.
- Você é uma garota forte, vai conseguir. Mas eu posso ficar
aqui se você quiser.
- Eu vou conseguir, mamãe disse que estamos protegidos se
orarmos... – Audrey quase sorriu.
- É isso aí, garota.
- Fique com isto... – Audrey tirou a pulseira que estava em
seus braços e estendeu para Jennifer.
- Hã... – Jennifer olhou pra pulseira, era a coisa mais feia
que já tinha visto na vida – O que é isso?
- Pra proteger você, foi papai quem me deu...
- Acho melhor você ficar com ela, é você quem está com medo.
- Mas quero que você seja protegida também...
Jennifer não tinha escolha, precisava usar aquela coisa feia
só pra não fazer feio perto da garota.
- Ok – Ela pegou a pulseira – Posso colocar no meu bolso?
Quero usar só quando eu estiver sentindo medo.
- Tudo bem – Audrey assentiu, devagar, ela era a coisa mais
linda do mundo.
- Agora vá dormir, tudo bem?
Audrey assentiu novamente, sorrindo sem amostrar os dentes.
Jennifer passou a mão pelos cabelos loiros da garota e depois saiu do quarto,
deixando novamente a luz acesa.
Ela andou pelo corredor de madeira novamente e depois desceu
as escadas. Mal tinha colocado os pés no chão e o telefone tocara novamente.
Andou até o aparelho e o colocou na orelha.
- O que foi agora?
- É assim que você trata os amigos que ligam pra casa dos
Tristan – Era a voz de sua amiga Amy.
- Amy, oi – Jennifer parecia aliviada – Desculpa, estão
passando trote pra cá, isso ta me deixando louca.
- É claro que estão, é halloween querida.
- Tanto faz – Jennifer andou até a cozinha.
- Só liguei pra saber como você está se saindo nessa missão
babá, sabe, você não tem cara de quem leva muito jeito pra isso.
- Eu sei – Jennifer abriu a porta da geladeira e retirou um
copo de leite – Mas estou me saindo muito bem. Acabei de convencer a pequena
Audrey de que monstros não existem e que o melhor que ela faz é dormir.
- Nossa Jen, como você é boazinha. Se fosse eu no seu lugar
aproveitaria pra assustar a garota com uma das minhas histórias de terror.
- Eu sei, você não presta – Jennifer andou até a sala.
- E falando em história de terror, já foi checar se a lenda
da casa dos Legenkamp é verdadeira?
- Claro que não – Ela olhou pela janela, podia ver a casa
abandonada dos Legenkamp perfeitamente, estava há uns cinqüenta metros da casa
dos Tristan, só se podia chegar lá se entrasse pelas inúmeras árvores – Você
sabe que não tenho tempo pra essas baboseiras.
- Como assim baboseiras? – Amy parecia indignada – A casa
dos Legenkamp é uma lenda, querida. Muitas pessoas dizem que viram os fantasmas
daquela família por ali e que a casa é mortal. E não é a toa, qualquer casa
onde um homem louco tenha matado a esposa e os filhos seria assombrada, não é?
Aliás, você deveria estar com medo, já que o maridão encarnou o iluminado em
dobro e também mandou a babá e um casal desconhecido pro outro mundo.
- É, você tem razão, eu deveria estar com medo só porque
estou trabalhando de babá numa casa próxima a casa da tragédia que ocorreu há
alguns anos – A voz de Jennifer era irônica.
- Vai dizer que isso não te deixa pelo menos tensa? – Amy
parecia indignada – Jen, o cara tirou todos os dentes da filha, colocou num
arame e escreveu “Feliz Halloween” neles, isso é de revirar testículos.
- Claro que é cruel, mas não preciso ficar com medo por
causa disso.
- Você pode me dizer pelo menos como é a casa?
- Estou olhando pra ela agora – Jennifer tomou um gole de
leite – Ela é velha, está caindo aos pedaços, suas cores estão desbotando, mas
não é tão macabra quanto o quadro da família Tristan.
- Deve ser emocionante. Se eu não estivesse aqui com o Billy
dava uma passada aí.
- E onde vocês estão?
- Saímos da festa porque o seu amiguinho estava quase
pulando da calça quando ele me viu dançar. E acredite, a fantasia da Madonna
parece ter ajudado.
- Não me diga – Jennifer riu. Fechou a cortina da janela e
sentou-se no sofá, deixando o copo de leite na mesinha do centro.
- Eu sei que ele é idiota e inútil, mas você tem que admitir
que fomos feitos um pro outro.
- É claro que sim, ninguém pode discutir isso – Jennifer
sorriu.
- Ah, para de me zoar, sua gorda. Mas agora tenho que ir,
ele ta me esperando.
- Vai lá, se diverte.
- Tchau, sua piranha – Amy desligou.
Jennifer deu mais um sorriso antes de tirar o telefone da
orelha e colocá-lo de volta no gancho ao seu lado. Pegou o copo de leite de
cima da mesinha e tomou outro gole, olhando para o filme que ainda estava
passando na TV. Ela não conseguia entender mais nada, não fazia idéia de como a
mocinha e seu namorado foram parar no topo de um prédio com um monstro daquele
tamanho.
A campainha tocou e ela foi obrigada a se levantar
novamente. Quando chegou até a porta, logo pegou a sacola de balas, queria
estar prevenida, mas ao abrir a porta percebeu que não havia ninguém ali. E
também não se ouvia barulho algum a não ser o dos grilos.
Ela estranhou, mas andou até a varanda pra checar se havia
alguém. Olhou pros dois lados e sentiu um cheiro de podridão que não sabia de
onde vinha. Talvez as poucas crianças que moravam ali tivessem jogado sacos de
fezes, mas ela não conseguiu enxergar nenhum. Tapou o nariz com o braço,
fazendo uma careta. Desistiu e entrou na casa, só que a campainha havia tocado
novamente sem ela nem ter dado três passos.
Jennifer abriu rapidamente, queria flagrar quem estava
fazendo aquilo, mas não tinha ninguém ali. Ela olhou pra rua, nenhum movimento,
ela só conseguia ver árvores.
Quando Jennifer estava voltando para dentro, foi agarrada
pela cintura por seu namorado e deu um grito. Afastou ele com tapas, só depois
percebeu que se tratava de Thayer.
- Calma amor, sou eu – Ele disse, rindo – Nossa, como você é
forte.
- Thayer? Mas que droga! O que você ta fazendo aqui?
- Estava com saudades e resolvi passar aqui, relaxa – Ele
ainda estava rindo.
- Você sabe que não pode ficar aqui – Ela olhou além de
Thayer, queria ver se alguém estava chegando, mas não havia ninguém ali além
deles – Eu estou trabalhando.
- Eu sei, eu só queria te ver. Estava com saudades de você,
poxa. Saudades dessa sua pele morena e dos seus olhos claros. Do seu cabelo
cacheado e do cheiro do seu perfume. Da sua altura questionável e dessa sua
boca perfeita...
- Você pode continuar... – Jennifer cruzou os braços, estava
quase sorrindo.
- Você sabe que eu te amo, desculpa pela brincadeira.
- Ok... Mas é sério, você não pode ficar aqui. Se algum
vizinho vir você e contar pra senhora Tristan, ela me mata.
- Ninguém vai me ver aqui, é praticamente só mato. Aliás,
você só vai morrer com esse fedor antes – Thayer fez uma careta – O que é isso?
Cheiro de porco morto ou esgoto? – Ele olhou para os bonecos atrás dele – E
essa decoração realista é pra espantar as criancinhas?
- Eu sei – Jennifer fez uma careta por causa do fedor – Eles
são uma família meio estranha.
Thayer olhou para ela novamente.
- Então, a gente se vê amanhã? Tem uma festa de halloween
atrasado na casa do Oliver, a gente podia ir.
- Tudo bem – Jennifer sorriu – A gente se vê lá.
- Ok – Thayer aproximou-se dela e lhe deu um beijo. Eles se
afastaram apenas alguns centímetro, só para sentir a respiração do outro – Eu
te amo.
- Eu também te amo.
Thayer sorriu pelo canto dos lábios, fazendo sua namorada
delirar por dentro e se sentir idiota ao mesmo tempo por ser uma daquelas
garotas que acham que seus namorados são príncipes encantados. Mas para ela,
ele era bem mais que isso.
Assim que Thayer começou a andar, Jennifer entrou na casa.
Ela o observou dobrar para as árvores. Eles se deram um ultimo sorriso antes de
Thayer desaparecer e Jennifer entrar novamente na casa. Ela fechou a porta e
andou até a sala, a TV estava desligada. Logo uma série de dúvidas atolou em
sua cabeça, já que ela se lembra que tinha deixado a televisão ligada.
Ela olhou pro controle encima do sofá, estava exatamente no
lugar onde ela havia deixado, exatamente na posição em que ela lembrava.
Com a TV desligada, apenas a luz da lua cheia iluminava a
sala pela janela, mas isso seria impossível, já que Jennifer lembra de ter
fechado as cortinas. Ela andou até a janela e olhou para a casa dos Legenkamp
novamente, a lua cheia parecia estar sobre ela, aquela visão daria uma boa foto
assustadora.
Quando ouviu um barulho na cozinha, ela olhou para trás, não
havia anda ou ninguém ali.
- Andy? Audrey? Vocês estão ai? – Ela gritou, só para se
certificar, mas não obteve resposta.
A única coisa que ela pôde ouvir foi o telefone tocar, ele
tinha lhe dado um susto. Ela correu para atender, esperando que fossem os
senhores Tristan dizendo que já estavam voltando.
- Alô?
Ninguém respondeu, Jennifer apenas ouviu uma risada macabra
do outro lado da linha. A risada fez seu corpo todo se arrepiar de uma vez só,
agora ela estava com medo.
- Eles são reais... – Disse a mesma voz de antes.
- O que?
- Eles são reais...
A campainha tocou quando a voz macabra parou de se
pronunciar. Jennifer pegou o bastão de baseball de Andy que estava ao lado da
TV e andou até a porta com ele em posição de ataque. Se alguém quisesse fazer
mal a ela, aquilo ajudaria.
Devagar ela colocou a mão na maçaneta e a girou, com medo do
que podia encontrar ao abrir a porta. E quando a maçaneta estava completamente
girada, ela abriu a porta com força e preparou o bastão. Não tinha ninguém ali
também, alguém estava definitivamente brincando com ela. A única coisa que ela
podia sentir era o fedor forte, que de algum jeito parecia ter piorado.
Jennifer andou pela varanda, procurando quem estivesse
fazendo aquilo, torcendo para que fosse Thayer novamente. Ela chegou até o
boneco da garota que estava enforcada perto da cadeira de balanço. Olhou bem
para o rosto dela, estava mais medonho que antes. Depois ela a balançou, estava
leve, mas ainda parecia real demais.
Ela andou pra trás ainda olhando pra garota enforcada e
acabou tropeçando numa abobora. A distração a fez cair encima do boneco que
estava nas pequenas escadas. Sua mão caiu exatamente no lugar onde estavam suas
tripas e seu rosto ficou sujo de sangue falso. Mas tinha alguma coisa errada.
Ela olhou para as tripas falsas e as amassou. Depois olhou pro sangue, o fedor
estava vindo dali. Ela olhou pro rosto do boneco, estava virado pro lado.
Quando ela tocou em sua cabeça, seu rosto virou e o outro lado apareceu, estava
sem uma parte do rosto que estava sendo comida pelos insetos.
Assim que Jennifer percebeu o que estava acontecendo, se
afastou dele dando um grito. Ela se lembrou do que o homem disse ao telefone,
“Eles são reais”, e tudo se encaixava. Aquilo não era um boneco, era uma pessoa
real que estava morta, assim como a garota enforcada.
Jennifer gritou novamente e depois correu pra casa. Ela
trancou a porta, aos prantos, quase não conseguiu girar a fechadura de tanto
que estava tremendo. Subiu as escadas correndo e entrou no quarto de Andy. Ela
gritou e o remexeu na cama até acordá-lo. O puxou pelo braço até o quarto de
Audrey sem o garoto saber o que estava acontecendo.
- Audrey! Audrey! – Ela acordou a garota, aos gritos – Vem!
A gente tem que sair daqui!
-Jennifer... – Audrey esfregou os olhos – Papai já chegou?
- Anda! Vem logo! – Jennifer puxou a garota da cama e correu
com os dois.
Eles passaram na cozinha, onde ela pegou as chaves do carro
ao lado da geladeira. Correu com eles até a porta de vidro que dava pra piscina
e passou por ela até a garagem.
- Entrem aqui! Entrem aqui! – Ela gritou.
As crianças, assustadas, entraram no carro sem falar nada.
Jennifer abriu a porta do motorista com a chave e entrou. Apertou o botão pra
porta da garagem se abrir e tirou o celular do bolso. Discou 911 e começou a
falar com uma atendente da polícia.
- 911 qual a sua emergência?
- Tem corpos na casa, alguém os matou e colocou lá! –
Jennifer gritou.
- Acalme-se senhorita, onde você está?
- Evergreen 311, estou servindo de babá! Estou com as
crianças aqui!
- Temos uma viatura aí perto, se tranque num quar...
A moça não conseguiu terminar de falar. Um homem mascarado
quebrou o vidro do carro com as mãos e agarrou o pescoço de Jennifer, fazendo o
celular cair. As crianças começaram a berrar lá atrás enquanto Jennifer tentava
se livrar.
- Corram! – Ela gritou, assim que conseguiu tirar a máscara
preta do homem.
As crianças abriram a porta e correram. Jennifer, por sua
vez, quase parou de lutar quando percebeu que era o senhor Tristan tentando
esganá-la.
- As crianças são minhas! – Ele gritou e olhou para elas,
estavam correndo na rua.
- Não! – Jennifer abriu a porta e o jogou para trás.
Ela tentou sair rápido, mas acabou caindo, teve que
engatinhar. Deu tempo suficiente para o senhor Tristan agarrar seu pé. Ela o
chutou e correu pra dentro da casa, não tinha como ela sair pela porta da
garagem sem ser pega por ele.
Correu na direção da porta de vidro e a abriu, mas teve que
recuar quando viu o corpo da senhora Tristan jogado na piscina. O choque foi
enorme, Jennifer não conseguia mais pensar, só sabia que precisava sair dali
antes que a história se repetisse.
Antes que ela pudesse correr dali, o senhor Tristan a
agarrou. O impacto foi tão grande que os dois acabaram caindo na piscina. Ele
logo tentou afogar a garota, que teve que se segurar no corpo da senhora
Tristan para poder ter forças para subir novamente até a superfície.
Jennifer lhe deu um soco certeiro, que foi o suficiente para
ele soltá-la e deixá-la nadar até a borda. Ela correu, tentando não escorregar,
já que estava molhada. Foi até a porta da entrada e a abriu. Correu com todas
as forças para fora da casa e olhou para trás, só pra saber se ele estava indo
atrás dela. Acabou dando de encontro com um dos policiais que havia chego ao
local.
No susto, Jennifer gritou e tentou se soltar dos braços do
policial, até perceber quem ele era.
- Tudo bem, tudo bem – Ele disse, para fazê-la parar de se
debater.
- Ele está lá dentro! Ele quer me matar! Ele quer matar as
crianças!
- Tudo bem, você está segura agora. Quem quer matar você?
Que crianças?
- O pai deles! – Ela gritava sem parar.
Os policiais olharam pra casa, achando que aquilo era uma
brincadeira de mal gosto. Eles trocaram um olhar duvidoso antes de voltar a
atenção novamente para Jennifer.
- Se isso é uma brincadeira, você pode parar agora, já se
divertiu o bastante.
- Não! – Jennifer gritou mais alto – Você não está me
ouvindo? Ele quer matar todos nós!
- Por que você entrou nesta casa? –Perguntou o policial lá de
trás.
- Eles me chamaram pra ser babá...
- Babá na casa abandonada dos Legenkamp?
- Não! Naquela casa! – Jennifer virou-se e apontou para a
casa, mas o que viu era totalmente diferente.
A casa havia mudado. Não estava mais ali a casa branca e com
decoração de halloween, ali estava a casa dos Legenkamp, a mesma que ela vira
pela janela de dentro da casa dos Tristan. Mas como seria possível?
Os policiais perceberam a discórdia no olhar de Jennifer,
ela parecia louca e confusa ao mesmo tempo.
- Não... – Ela sussurrou para si mesma, o que estava
acontecendo? – Não! – Ela gritou e correu para dentro da casa.
Os policiais correram atrás dela. Os três pararam na sala.
Era exatamente como Jennifer lembrava, mas estava tudo velho, sujo e
abandonado, não parecia a mesma sala em que ela assistira filme há poucos
minutos.
Ela olhou para tudo, não era possível, ela não era louca e a
casa dos Legenkamp podia ser vista da janela. Ela correu até lá e olhou, mas só
havia a lua cheia. Onde ela tinha visto a casa abandonada havia apenas mato.
Isso foi o bastante pra ela chorar mais e se desesperar como nunca.
- Ali! – Ela apontou pro quadro velho – Foram eles que me
contrataram! O senhor e a senhora Tristan!
Um dos policiais levou sua lanterna até o quadro e depois
olhou para Jennifer, assustado.
- Estes são a família Legenkamp, eles foram assassinados
nesta casa há vinte anos...
- Não! – Jennifer gritou – Não! Não! Não... – O ultimo “Não”
saiu apenas como sussurro, estava se perguntando como aquilo poderia ser
possível.
--
- Tudo bem, Jennifer – Disse o detetive, do outro lado da
mesa – Posso ligar pros seus pais agora?
Jennifer não disse nem uma palavra, continuou sentada,
fitando as mãos encima da mesa marrom, provavelmente nem tinha escutado o que o
detetive tinha dito. E ele não insistiu, ela estava uma bagunça. Suja de lama,
molhada, machucada, e seu olhar parecia sofrido, o detetive estava convencido
de que ela era louca.
- Vocês dizem que o que eu disse nunca aconteceu... Meu
namorado foi até lá... Minha amiga me ligou...
- Sim, Jennifer, Amy Brown ligou para você, mas foi para o
seu celular. Seu namorado nunca foi ver você, ele está tão bêbado em casa que
quase teve um coma alcoólico.
- Não... – Jennifer prendeu o choro com todas as forças.
- Bom – O detetive suspirou – Vou ligar pros seus pais
agora, você precisa descansar... – Ele deu uma ultima olhada na garota e depois
se retirou da sala.
Lágrimas caíram no rosto de Jennifer e ela as limpou com sua
mão suja de lama. Ela não poderia estar louca, tinha certeza que tudo o que
tinha vivido foi real e que deve haver outra explicação para tudo. Ela pensou
em fantasmas vingativos, fazia muito sentido eles repetirem a história porque
não puderam descansar em paz, por isso algumas babás foram encontradas mortas.
Mas quem acreditaria nela? A partir daquele dia até seus pais acreditariam que
ela precisa de tratamento psicológico, já que ela não viu apenas fantasmas, mas
também seu namorado, que de acordo com todos, estava tão bêbado que não
conseguia nem abrir os olhos.
Jennifer arriou a cabeça na mesa e fitou seu all star preto,
ainda não conseguia controlar as lágrimas. Só o que ela pensava era que as
crianças pareciam ser muito reais e inocentes, foi aí que ela se lembrou de
Audrey. Audrey havia lhe dado uma pulseira enquanto ela estava na casa, e isso
não provaria nada a ninguém, mas ela podia ter a certeza para ela mesma de que
não estava louca.
Logo se ajeitou na cadeira e enfiou a mão no bolso da calça,
assim que sentiu a pulseira ela a puxou, mas teve uma surpresa. As esferas
roxas não estavam mais ali, e no lugar delas havia dentes humanos enrolados num
arame. Ela o estendeu e percebeu que estava escrito “Feliz Halloween”. E
naquele momento, só o que ela podia fazer era gritar, aquele Halloween tinha
sido marcado para sempre.